domingo, 14 de abril de 2024

Canções antecedentes ao Coral Santa Cecília (Adair Philippsen)

 

Eram cantos de exaltação a deus, à maneira de oração, cientes do ensinamento de santo Agostinho sobre a importância da oração na vida cristã:

Quem canta reza duas vezes.”

Entre os cantos-orações, destacavam-se, em alemão:

Großer Gott (talvez o primeiro do repertório);

Maria zu lieben, e

Heilige Geist; e, em latim,

Laudate dominum, de Mozart.

Mas também cantavam seu amor à natureza e à pátria brasileira, suas tradições e nostalgia dos ancestrais e dos lugares de outrora, como

Wie die Schwalben ziehen fort sie kehren wieder her¹, canção entoada pelos primeiros imigrantes vindos da Alemanha.

¹Quando as andorinhas partem, elas retornam novamente.


Fonte: Philippsen, Adair. Um século de encanto. Breve histórico do Coral Santa Cecília de Santo Cristo. Santa Rosa: Public Gráfica e Gravadora, 2016, p. 13

Cancioneiro de Otto Brod (Adair Philippsen)

 

Estabelecido em Linha Taquaruçu (f. 1973). Privilegiada voz de baixo e pessoa muito divertida, mantinha rico repertório de canções alegres, na maioria pouco conhecidas, pois sem publicações em textos. Passou-os para seu sobrinho, padre Ivo Bersch, que os organizou no cancioneiro Recordar é Viver. Entre elas:

Das ABC

Die Modendamen

S’war mal ein kleiner Mann

Ein Soldat in einer Schenke

Holadiri

Klein, klein dar sie nicht sein

Bei Kaiserin Phylomine

Der Flöh Fang


Fonte: Philippsen, Adair. Um século de encanto. Breve histórico do Coral Santa Cecília de Santo Cristo. Santa Rosa: Public Gráfica e Gravadora, 2016, p. 18

Dialeto (Adair Philippsen)

 

(…) os cantores, no dia a dia, falavam o Hunsrückish, variedade linguística de Hunsrück¹, mas que sofreu o “aportuguesamento” nas colônias devido ao reduzido contato com falantes de português, agravado pela falta de oferta do ensino oficial nas áreas interioranas.

Surgiu então o Hunsrückisch Platt, verdadeiro símbolo da cultura teuto-brasileira, contudo marcado por palavras estranhas ao Hochdeutsch², donde a inicial dificuldade de compreensão, como destaca Roque Danilo Bersch, resultou em variante linguística pouco estudada.

¹O Hunsrück é uma serra de montanhas baixas, às margens do Rio Reno e Mosela, no oeste da Alemanha, região de onde partiram centenas de famílias para o Brasil no começo do século XIX, impulsionadas pelo sonho de um mundo melhor nas selvas do Brasil.

²Variante oficial (standard ou padrão) do alemão.


Fonte: Philippsen, Adair. Um século de encanto. Breve histórico do Coral Santa Cecília de Santo Cristo. Santa Rosa: Public Gráfica e Gravadora, 2016, p. 24

Cubiertos (Causo do Maestro Guido por Adair Philippsen)

 

Encontro de dois dias em Monte Caseros, Argentina. No convite, a observação:

- Por favor, traigan cubiertos.

Desde os doze anos, com seu irmão Ivo, Guido cantava música de Miguel Aceves Mejia, guarânias, boleros e tangos. Julgava-se pós-graduado em espanhol e por isso recomendou aos coralistas:

- É fim de inverno, vamos mais ao Sul, em campo aberto, na margem do rio, pode ser frio. Levemos, pois, cobertores.

Na primeira noite os anfitriões serviram boi assado com couro e pelo, bastante alho e outros temperos. Muitos pedaços com mais pelo do que carne – o Kuno Bieger (in memoriam), na viagem de retorno, ainda cuspia pelos de boi…

No segundo dia almoçaram na sede da gendarmeria na beira do rio Uruguai. Na entrada pediram:

-¿Trajeron los cubiertos?

Só então descubriram que cubiertos são talheres!

E o ônibus abarrotado de cobertores.


Fonte: Philippsen, Adair. Um século de encanto. Breve histórico do Coral Santa Cecília de Santo Cristo. Santa Rosa: Public Gráfica e Gravadora, 2016, p. 52

quarta-feira, 10 de abril de 2024

Parmênides (o uno e o múltiplo, as formas inteligíveis)

 

Eis o problema. Quando enunciamos Não é, queremos indicar outra coisa, tirante a ausência de existência naquilo que afirmamos não ser?

Não será senão isso.

Quando dizemos que alguma coisa não é, não queremos afirmar com isso que, em certo sentido, ele não é, mas que noutro sentido é? Ou a expressão Não significa, de maneira rigorosa, que o que não é não existe em absoluto e não participa de nenhum jeito da existência? É tomada no mais rigoroso sentido. Logo, o que não é, de jeito nenhum poderá participar da existência.

Não, de fato.

0 formar-se e o perecer, em que poderão consistir, se não for em adquirir existência ou em vir a perdê-la?

Em nada mais.

Mas o que em nenhum modo participa da existência, não poderá adquiri-la nem vir a perdê-la. Como o poderia?

0 Uno, por conseguinte, que todo o jeito não é, não pode receber nem perder a existência nem dela participar.

Sem dúvida.

Logo, o Uno que não é nem parece nem nasce, visto não participar de modo algum da existência.

É claro que não.

Nem se altera de maneira nenhuma; se tal acontecesse, nasceria e pereceria.

É verdade.

E se não se altera, não será também forçoso não mover-se?

Necessariamente.

Como também podemos dizer que o que não existe em parte alguma não está em repouso; o que repousa terá de permanecer no mesmo lugar.

No mesmo, como não?

Voltamos, por conseguinte, a afirmar que o que não é não está parado nem em movimento.

Não de fato.

Como não tem nada do que é; se participasse de alguma coisa, participaria também do ser.

É claro.

Como não terá grandeza nem pequenez nem igualdade.

Sem dúvida.

Nem semelhança nem diferença, tanto em relação consigo mesmo como com as outras coisas.

É evidente que não.

Como! As outras coisas poderiam ser algo para ele, se nada terá de estar em relação com ele?

Não é possível.

Como as outras coisas não lhe serão nem iguais nem desiguais, nem idênticas nem diferentes.

Sem dúvida.

E então? As expressões Daquele ou Para aquele, Alguma coisa, Deste, A este, De outro ou Para outro, ou ainda: Outrora, Mais tarde, A gora, Conhecimento, Opinião, Sensação, Definição ou Nome, ou seja o que for, poderiam aplicar-se ao que não é?

De jeito nenhum.

Desse modo, o Uno que não é não tem condição de espécie alguma.

Parece mesmo que não tem.

Passemos agora a considerar o que acontecerá com as outras coisas, se o Uno não é.

Sim, façamos isso mesmo.

Obviamente, é preciso que sejam outras; se não fossem outras, nada se poderia dizer das outras coisas.

Certo.

Ademais, se é das outras coisas que se fala, terão de ser diferentes. Ou não empregas para a mesma coisa a expressão Outra e Diferente?

Sem dúvida.

Porém quando dizemos Diferente, queremos significar que é diferente de algo diferente, e que Outro, também, é outro de outra coisa.

Certo.

Para as outras coisas, também, se tiverem de ser outras, terá de haver outras coisas com relação às quais elas sejam outras.

Necessariamente.

Que será? Do Uno é que elas não poderão ser outras, porque o Uno não é.

Não, de fato.

Nesse caso, terão de ser outras entre elas mesmas; é só o que lhes resta, para não serem outras em relação a nada.

Certo.

Assim, é sempre em grupos que cada uma é outra em relação às outras; como unidade é que não poderão ser já que o Uno não é. Pelo contrario; ao que parece, cada uma dessas massas é infinita em número, e quando alguém pensa haver tomado uma porção mínima, de súbito, como nos sonhos, em vez de uma, como parecia, nos surge múltipla, e em lugar de muito pequena, imensamente grande, comparada com as partículas de que é composta.

Certíssimo.

É como massas desse tipo que as outras coisas são outras em si, se forem outras sem que haja o Uno.

Perfeitamente.

Terá de haver, portanto, grande número dessas massas que individualmente parecerão unidade, sem que, no entanto, o sejam, visto não haver o Uno.

Isso mesmo.

Como também parecerá que elas formam número, sem que em verdade o sejam, uma vez que há o Uno.

Como não há.

E também parecerão conter, é o que dizemos, a quantidade mínima; mas essa quantidade parecerá múltiplas e imensa em comparação com cada um desses múltiplos que em si mesmos são pequenos. Como não?

Ademais, cada massa será imaginada como igual a suas numerosas e pequenas partes, pois não poderá parecer que passa da maior para a menor antes de dar a impressão de chegar ao meio, o que já seria um simulacro e igualdade.

É provável.

E cada massa, não parecerá limitada com relação às outras e a si mesma, conquanto não tenha nem começo nem meio nem fim?

Como assim?

Porque se em qualquer delas considerarmos em pensamento algo nesse sentido, por detrás do começo aparecerá outro começo, para além do fim sobrará sempre outro fim, e no meio, mais central do que ele, outro meio menor, por não ser possível conceber nenhum deles como unidade, visto não existir o Uno.

Perfeito.

Assim, todo ser que concebermos em pensamento, terá forçosamente de milpartir-se em pedacinhos, segundo creio; será sempre apreendido como massa carecente de unidade.

Perfeitamente.

Para quem as contemplar de longe, com vista turva, cada uma dessas massas aparecerá forçosamente como unidade; mas para quem as examinar de perto, com espírito atilado, cada uma se revelará como multidão infinita, visto carecer do Uno que não é. É mais do que obrigatório ser dessa maneira. Assim, terão as outras coisas de parecer infinitas e limitadas, unas e múltiplas, no caso de não existir o Uno, mas apenas as outras coisas que não o Uno.

Sem dúvida.

E não parecerão também semelhantes e dissemelhantes?

Como assim?

À maneira de certos quadros: de longe, tem-se a impressão de unidade, parecendo, assim, de característica uniforme e semelhante. Perfeitamente. Porém de perto, aparecem como múltiplo e diferente, e esse simulacro de diferença lhes empresta caráter de diversidade e de dissemelhança consigo mesmo.

Certo.

É, pois, inevitável que as massas pareçam semelhantes e dissemelhantes, tanto entre elas como individualmente consideradas.

Perfeitamente.

Como também iguais e diferentes entre elas mesmas, em contacto e separadas, agitadas por toda espécie de movimento e imóveis de todas as maneiras, nascendo e morrendo e sem nascerem nem morrerem, e tudo o mais do mesmo gênero que nos fora fácil enumerar, uma vez que, não havendo o Uno, só há multiplicidade.

É mais do que certo.

Agora, voltando mais uma vez para o começo, digamos o que acontecerá se o Uno não é, porém sejam as outras coisas que não o Uno.

Sim, digamos isso mesmo.

Então, as outras coisas não poderão ser um.

Como o poderiam?

Nem muitas, também, pois se fossem muitas, o Uno estaria entre elas. Mas se nenhuma delas é um. Em conjunto serão nada, do que resulta não serem muitas.

É verdade.

Mas, se entre as outras coisas não há o Uno, aquelas nem serão muitas nem uma.

Não de fato.

Como não parecem ser nem uma nem muitas.

Por quê?

Porque de nenhum jeito e em caso algum as outras coisas poderão ter relação de qualquer natureza com o que não existe, não podendo nenhuma dessas coisas que não existem estar em nenhumas das outras, visto não haver partes do que não existe.

É verdade.

Como não haverá, também, nem opinião nem aparência do que não existe, não podendo, outros sim, em nenhuma condição e sob nenhum aspecto, ser concebido o que não existe.

Com efeito.

Se o Uno não existe, nenhuma das outras coisas poderá ser concebida como um ou como múltiplo, pois sem o Uno não é possível imaginar a pluralidade.

É impossível, realmente.

Logo, se o Uno não existe, as outras coisas nem são nem pode ser concebidas como unidade e nem como pluralidade.

Parece mesmo que não podem.

Nem como semelhantes nem como dissemelhantes.

Com efeito.

Nem como idênticas ou diferentes, nem em contacto nem separadas, e assim sucessivamente, com relação a tudo o que anteriormente elas nos pareciam ter. As outras coisas nem são nem parecem nada disso, uma vez que o Uno não existe.

É muito certo.

Desse modo, resumíssemos tudo isso e afirmássemos: Dado que não exista o Uno, nada existe, teríamos falado certo?

Com a maior exatidão possível.

Pois então afirmemo-lo, com o seguinte acréscimo, como parece: Quer o Uno exista quer não exista, tanto ele como as outras coisas, ou seja em relação com ele mesmo ou em suas relações recíprocas, todos eles de toda a maneira são tudo e não são nada, parecem ser tudo e não parecem nada.

Absolutamente certo.


Platão. Parmênides (o uno e o múltiplo, as formas inteligíveis) (Portuguese Edition). Edição do Kindle.

Versão eletrônica do diálogo platônico “Parmênides”

Tradução: Carlos Alberto Nunes

Créditos da digitalização: Membros do grupo de discussão Acrópolis (Filosofia)





domingo, 7 de abril de 2024

Receptor Digital de Ondas Curtas

 http://websdr.ewi.utwente.nl:8901/

Clique em START AUDIO

Digite a frequência na caixa kHz

Nesta página você pode ouvir e controlar um receptor de ondas curtas localizado no clube de rádio amador ETGD da Universidade de Twente 

Crédito para a imagem: http://websdr.ewi.utwente.nl:8901/IMG_5947a.JPG

Relação de emissoras e frequências em Ondas Curtas:

http://www.sarmento.eng.br/Prog.htm  

Acesso 07/04/2024


‘Algumas’ notas do subsolo de Dostoiévski

 (…) é no desespero que acontecem os prazeres mais intensos, especialmente quando você já percebe muito fortemente que sua situação não tem saída.

(…) o produto direto, imediato e legítimo da consciência é a inércia, isto é, o ficar-sentado-de-braços-cruzados conscientemente.

(…) todos os indivíduos e homens de ação diretos são ativos precisamente porque são obtusos e limitados. Como isso se explica? Da seguinte maneira: em consequência de sua tacanhez, tomam os motivos mais próximos e secundários como se fossem os motivos originais e, assim, eles se convencem mais rápida e facilmente do que as outras pessoas de que encontraram um fundamento irrefutável para a sua causa, e então ficam tranquilos. Isso é o mais importante. Pois, para se começar a agir, é preciso que antes se esteja completamente calmo e totalmente livre de dúvidas. E como eu, por exemplo, me tranquilizaria? Onde estão os meus motivos originais, nas quais me apoiaria? Onde estão os fundamentos? De onde vou tirá-los? Faço uma ginástica mental, e, em consequência, cada motivo original imediatamente arrasta atrás de si outro, ainda mais original, e vai por aí afora, até o infinito. Essa é precisamente a essência de toda consciência e reflexão. Portanto, novamente já estamos falando das leis da natureza. E, finalmente, qual é o resultado? O mesmo, ora. Lembrem-se: há pouco falei sobre a vingança (os senhores, na certa, não se aprofundaram no assunto). O que eu disse foi: o homem se vinga porque acha que está fazendo justiça.

(…) em toda minha vida nada consegui começar nem terminar. Está bem, está bem. Eu sou um tagarela, um tagarela inofensivo e enfadonho, como todos nós. Mas que se há de fazer se o único e evidente destino de todo homem inteligente é tagarelar, ou seja, dedicar-se propositalmente a conversas para boi dormir?

Penso até que a melhor definição para o homem é: um ser bípede e ingrato. Mas isso ainda não é tudo, esse não é o seu pior defeito: seu defeito mais grave é sua constante má conduta. Sim, constante, desde o dilúvio universal até o período schleswig-holsteiniano dos destinos da humanidade. A má conduta e, por consequência, a falta de bom senso (…)

Em suma, tudo se pode dizer da história universal, tudo que possa ocorrer à imaginação mais perturbada. Só uma coisa não se pode dizer: que ela seja sensata. Os senhores engasgariam na primeira palavra. E vejam até o que acontece volta e meia: constantemente aparecem na vida pessoas tão corretas e sensatas, tão sábias e amantes do gênero humano que assumem como seu objetivo de vida comportar-se da maneira mais correta e sensata possível para, por assim dizer, ser uma luz para os demais, provando para eles que é possível de fato viver neste mundo de maneira correta e sensata. E daí? Sabe-se que muitos desses amantes do gênero humano, uns mais cedo, outros mais tarde, alguns já no fim da vida, traíram a si mesmos, dando margem a anedotas, algumas até bem obscenas. Agora pergunto-lhes: o que se pode esperar do homem, sendo ele um ser dotado de características tão estranhas? Pois bem, cubram-no de todos os bens que há na Terra, mergulhem-no de cabeça na felicidade mais completa, de modo que somente borbulhas subam à superfície; deem-lhe tal bem-estar econômico, de modo que não lhe reste nada mais a fazer, além de dormir, comer (…)

Pois chegamos ao ponto de quase achar que a verdadeira “vida viva” é um trabalho, quase um emprego, e todos nós no íntimo pensamos que nos livros é melhor. E por que às vezes ficamos irrequietos, inventamos caprichos? E o que pedimos? Nós mesmos não sabemos. Nós mesmos nos sentiremos pior se nossos pedidos forem atendidos. Pois bem, façam uma experiência, deem-nos, por exemplo, mais independência, desamarrem as mãos de qualquer um de nós, ampliem nossa esfera de ação, relaxem a tutela e nós… eu lhes asseguro: nós imediatamente pediremos a volta da tutela. Sei que os senhores talvez fiquem bravos comigo, comecem a gritar e a bater com os pés (…)

Redução Jesuítica de São Nicolau

Fonte: Dostoiévski, Fiódor, 1821-1881. Notas do subsolo (recurso eletrônico); tradução do russo de Maria Aparecida Botelho Pereira Soares. Porto Alegre, RS: L&PM, 2011. Recurso digital – Coleção L&PM POCKET v. 670.



sexta-feira, 26 de janeiro de 2024

Canções antecedentes ao Coral Santa Cecília (Adair Philippsen)

  Eram cantos de exaltação a deus, à maneira de oração, cientes do ensinamento de santo Agostinho sobre a importância da oração na vida cr...