sábado, 27 de março de 2021

Voz de trovão (Sidinei José Brzuska)

 

A história conta que o político e advogado Gaspar Silveira Martins tinha voz de trovão. Não sabia falar baixo e, quando discursava, era impossível não parar para ouvi-lo. Lembrei da história de Silveira Martins na primeira vez que vi o Daltry falar durante uma sessão de júri.


O antigo prédio do foro de Santa Rosa tinha passado por uma reforma, a qual envolveu o local destinado às sessões do tribunal popular. O orçamento do Poder Judiciário andava curto e a empresa contratada havia falido, abandonando a obra pela metade. Na escassez, foram aproveitados, no salão do júri, antigos aparelhos de ar- condicionado, que faziam um barulho ensurdecedor quando ligados. Talvez por mal fixados, as paredes chegavam a tremer quando eram todos acionados. Não se sabia o que era pior: o calor infernal de Santa Rosa ou o barulho dos referidos aparelhos. Normalmente ligava-se um pouco, só para refrigerar o ambiente. A mesma sensação de alívio ocorria tanto no momento de ligar os aparelhos como no de desligar. Ninguém aguentava uma coisa só (calor ou barulho) o tempo todo.


Os aparelhos, a todo vapor, numa quente tarde de verão. Salão do júri lotado. O Erni, que terminara sua parte, passou a palavra para o Daltry. Usou, na primeira fala, uma voz de trovão que eu nunca tinha escutado. Nesse exato instante, despenca parte da frente de um dos aparelhos, caindo atrás da bancada dos jurados, produzindo um barulho forte e seco, semelhante ao estampido de uma arma de fogo.


Preocupado que alguém pudesse ter disparado um tiro no salão do júri, o Daltry interrompe a fala e olha diretamente para mim, que expliquei:


- Pode seguir a fala, doutor Daltry. Foi apenas a sua voz que derrubou um dos aparelhos de ar-condicionado.


No júri seguinte, antes dos debates, o Daltry perguntou se os aparelhos estavam bem firmes e se ele podia falar livremente, produzindo risos na assistência.


O interessante é que Daltry, no trato habitual, tem uma voz mansa, natural. A voz de trovão surgia apenas durante a atuação em plenário.


Fonte: Teixeira, Daltry Cardoso. Domador de sonhos. Evangraf/Praça da Matriz – Porto Alegre/Santa Rosa (RS), 2013, p. 217.



Poeminha de sábado

 


O Amor

O amor é uma flor, o amor é tudo!

Despretensioso, sem governos,
Desobedece ordens, atora preconceitos...

Ganha força, toma corpo, perde a vergonha,
Se intensifica o tal amor.
Qual curso d'água, qual ramo de flor...

E toma corpo, ganha força,
E irrompe!!!

em dois corações,
Desabrocha o amor...


Destaques de Dois Irmãos (MIlton Hatoum)

(...) as palavras parecem esperar a morte e o esquecimento ; permanecem soterradas, petrificadas, em estado latente, para depois, em isen...