Quando
nascemos, somos colocados no mundo com padrões de comportamentos
fixos e determinados. Com a educação e o convívio, vamos
absorvendo os valores da nossa cultura. E isso é feito de tal forma
que na vida adulta torna-se difícil saber o que realmente desejamos
e o que aprendemos a desejar. Observa-se que a insatisfação é
geral – nunca se venderam tantos ansiolíticos e antidepressivos
como agora -, mas modificar a maneira de viver e de pensar gera
ansiedade. O novo, o desconhecido, assusta. Entretanto, repetir o que
é aprendido como verdade absoluta gera sofrimento.
Há
cerca de 30 anos, assisti à peça No natal a gente vem te buscar,
de Naum Alves de Souza, que ilustra de forma dramática a submissão
aos valores sociais. Tentarei reproduzir a parte da história que
registrei e o diálogo que nunca me saiu da memória.
Duas
irmãs e um irmão. Uma delas não saía, ficava em casa com os pais,
totalmente submetida aos conceitos de certo/errado, bom/mau, que
tinha absorvido. Sua vida se resumia a ser guardiã da moral e dos
bons costumes. Recriminava a tudo e a todos por suas atitudes e
comportamentos. Os irmãos, por sua vez, buscavam viver suas vidas. O
tempo passa, os pais morrem e ela torna-se cada vez mais amarga. Num
determinado momento, os irmãos são chamados para acudi-la, pois
está enlouquecendo de tanto sofrimento. Ao vê-la naquele estado
deplorável, o irmão, perplexo, comenta com a irmã:
“Eu
não entendo. Ela ouviu de nossos pais as mesmas coisas que nós
ouvimos.”
A
irmã, então, lhe diz:
“É…
só que ela acreditou.”
O
fim do patriarcado traz nova reflexão sobre o relacionamento entre
homens e mulheres, o amor, o casamento e a sexualidade. Nossas
convicções íntimas mais arraigadas são abaladas, projetando-nos
num vazio. Os modelos do passado não respondem mais aos nossos
anseios e nos deparamos com uma realidade ameaçadora, por não
encontrarmos modelos em que nos apoiar, em tempo algum, em nenhum
lugar.
Essa
pode ser a grande saída para o ser humano. Percebendo as próprias
singularidades e não tendo mais que se adaptar a modelos impostos de
fora, abre-se um espaço em que novas formas de viver, assim como
novas sensações, podem ser experimentadas.
Capa:
Folio Design
Fonte:
Lins, Regina Navarro. A cama na varanda: arejando nossas ideias a
respeito de amor e sexo. 14ª ed., Rio de Janeiro: Best Seller, 2020.
p. 458.