terça-feira, 28 de fevereiro de 2023

Intuiciones en torno al mate (Carmen M. Cáceres)


La esencia del mate se juega en la yerba. Bien dispuestas en el recipiente, las hojas secas y troceadas entran en contacto con el agua caliente y desprenden un sabor amargo que va perdiendo aspereza en las cebadas hasta alcanzar un tenue gusto vegetal. Este feliz equilibrio se mantiene hasta que la yerba termina de cumplir su proceso de oxidación. Hinchadas y oscuras, las hojas se vencen, se agostan y dan al agua caliente una pesadez ferrosa que se estanca en el estómago.


(…) en un buen mate la yerba cumple su proceso vital cuidadosamente dispuesta en el recipiente, con la asistencia de una bombilla inmóvil que jamás quema los labios y permite que el agua suba amable, portanto su viejo letargo estacional. Según la tradición, el mate malo no es tanto el que sabe mal – algunos problemas de sabor se pueden corregir en las sucesivas cebadas – sino el que se va arruinando con las cebadas porque el agua se enfría rápido o la yerba se oxida de golpe y acidifica. Aquí entran en juego las habilidades de la persona que ceba, encargada de mantener el conjunto y estabelecer un ritmo, una fluidez coreográfica en el cebar, pasar, esperar. La cebadora o cebador es importante pero su importancia no es la de un maetro de ceremonias sino la de un buen traductor: cunto más invisible, mejor.


El nombre técnico es Ilex paraguariensis, se lo dio el francés Augustin Saint-Hilaire en 1822, cuando publicó la primera descripción taxonómica de la yerba en la revista Mémoires du Muséum d’Histoire Naturelle.


«Mi único diálogo verdadero es con este jarrito verde». Estudiaba el comportamiento extraordinario del mate, la respiración de la yerba fragantemente levantada por el agua y que con la succión baja hasta posarse sobre sí misma, perdido todo brillo y todo perfume a menos que un chorrito de agua la estimule de nuevo, pulmón argentino de repuesto para solitarios y tristes.

Julio Cortázar, Rayuela (1963)


El sabor, amargo, del mate me llena la boca y el líquido caliente, que me hace sudar y va como barriendo los restos del sueño, pasa por mi garganta, hasta que las ultimas chupadas, que hacen subir por la bombilla a la boca cada vez menos líquido, terminan produciendo, en el fondo del mate, un murmullo ronco y apagado.

Juan José Saer, Nadie, nada, nunca (1980)


Caiguá era la calabacita que se usaba de vaso y el nombre estaba compuesto por las voces caá (yerba), i (agua) y guá (recipiente). Bombilla se decía tacuapí, compuesta por las voces tacuá (caña hueca) y apí (lisa o alisada). Y a la caldera con agua caliente se designaba itacuguá, donde i era agua, tacú caliente y guá recipiente.


Durante el apogeo jesuita en América, a la infusión se le incorporó el sufijo quechua «mate», que era como se llamava en la zona de los Andes peruanos al fruto de la planta Lagenaria vulgaris que da la calabacita que se usaba como recipiente. El caá-mate pasó a nombrar la infusión de yerba caá que se tomaba en esa calabacita por medio de una bombilla. Según Amaro Villanueva, los colonizadores españoles prefirieron el vocablo mate porque resultaba más afín a la entonación grave del idioma español (en detrimento de la aguda del guaraní) y así se extendió durante los siglos XVIII y XIX por los Virreinatos del Perú y del Río de la Plata. Mate: una única palabra de otro idioma para designar la yerba, el recipiente que la contiene y la infusión entera.


Jamás decimos que el mate es rico, sino que está rico. El sabor agradable no es una constante en la ceremonia sino solo una de sus etapas. Por eso quienes prueban el mate casi siempre lo rechazan la primera vez. Para alcanzar el placer debe haber un crecimiento (o endurecimiento) del paladar, un proceso de culturalización.


El mate no es un medio sino un fin en sí mismo. No se bebe: se toma, se posee. En nuestra cultura, toma mate quien tiene sus utensilios y lo hace todos los días. El resto no toma mate, a lo sumo se toma un mate.


La combinación entre el tipo y disposición de la yerba, el recipiente y la temperatura del agua generan un ejemplar único del mate que se convierte en la huella dactilar de quien lo prepara.



Fonte: Cáceres, Carmen M. Al borde de la boca: diez intuiciones en torno al mate. 1ª ed. Ciudad Autónoma de Buenos Aires: Fiordo, 2022, p. 18/19/30/43/68/69/78/79/108/109.

Remembranças - Darcy Azambuja por Carlos Reverbel

 

Guardada a distância devida ao seu gênio literário, talvez já me encontre na situação em que se colocava Alcides Maya, quando dizia não passar “de um velho jornalista, com espaço franqueado para publicação de suas remembranças.”


Há palavras que me fazem evocar o velho Alcides, acreditando aconteça o mesmo com aqueles que leram seus livros e o conheceram de perto. Em geral, as palavras são como gado orelhano, não tem marca nem sinal. Mas o velho Alcides adonava-se de certas palavras, sentando-lhes a sua marca. Por exemplo: esta palavra remembrança. No vocabulário alcidiano, ganhava singular expressão, como se fosse sua.


Li outro dia nos jornais a notícia de que foi apresentada uma dissertação de mestrado sobre a obra de Darcy Azambuja. Então me ocorreram algumas “remembranças”, ligadas ao saudoso escritor, na sua feição humana, como pessoa.


Certa vez, entrando numa fila de cinema, estavam colocados na minha frente Darcy Azambuja e sua esposa, a querida dona Maria. Na época, ele ocupava o cargo de secretário do Interior, no exercício do governo do Estado. E apesar da alta investidura, ali se encontrava, pegando o seu cineminha, como qualquer cidadão comum. Depois de sessão do Cinema Rex, foi tomar chá na Confeitaria Central, recolhendo-se a pé para sua residência, uma casa modesta da Rua Jerônimo Coelho.


Recém chegado da Encruzilhada, sua terra natal, para ingressar na faculdade de Direito, o futuro autor de “No Galpão” (um clássico do nosso regionalismo literário, na mesma linhagem de J. Simões Lopes Neto) foi trabalhar como caixeiro da Casa Bromberg, pois sua família era apenas remediada, com poucos recursos para custear seus estudos em Porto Alegre. Tendo tirado, ainda como caixeiro, o primeiro lugar num concurso nacional de contos, convidaram-no para trabalhar no órgão oficial, “A Federação”, assim começando sua carreira como jornalista. Terminou-a como diretor do “Jornal da Manhã”, sucedendo a Fernando Caldas, fundador do jornal.


Passados alguns anos, convidaram-no para editorialista do “Correio do Povo”, em substituição a Edgar Schneider, que fora eleito deputado federal, fixando residência no Rio. Disse-me que aceitara o convite, mas pediria alguns dias de prazo para iniciar o serviço. Nesse meio tempo, mandou me chamar:


- “Quero que me acompanhes na visita que vou fazer ao dr. Breno, para agradecer-lhe a distinção e dizer-lhe que fiquei honrado mas não posso aceitar.”


E segredou-me o verdadeiro motivo de sua desistência: “Se for trabalhar no jornal, perderei os três meses de férias na Faculdade, talvez a única vantagem de ser professor.”


Esses três meses ele os vivia numa pequena casa em Ipanema, trocando-a, mais tarde, por um apartamento em Torres, situado num bloco arquitetônico que recebeu o apelido de Vila do IAPI, o que bem demonstra a modéstia da construção. Fomos condôminos nesse edifício. E então pude frequentá-lo diariamente, admirar a simplicidade de sua vida, a finura de suas maneiras e, sobretudo, o relacionamento perfeito com a esposa. Eram duas pessoas num só coração. De temperamentos tão diferentes, nem isto alterava o convívio harmonioso, o companheirismo, a delicadeza e a doçura do casal, no aconchego da mútua dedicação.


Homem de grande saber, com uma obra literária e uma posição universitária eminentes, Darcy Azambuja apresentava traços, na sua modéstia e singeleza, de algumas de suas personagens, aquelas em que se reflete a alma simples da boa gente camponesa. Tomador de mate amargo e pitador de fumo crioulo (como o grande Augusto Meyer), parecia um velho chiru galponeiro.


Contrariamente ao que em geral se verifica entre escritores, não promovia sua carreira, nem preparava a sua glória. Uma vez desencavei, em velho almanaque da Livraria do Globo, um de seus melhores contos, reproduzindo-o na “Província de São Pedro”. Ele não se lembrava de ter escrito e publicado esse conto, ficando muito grato pela minha “descoberta”. E outra vez, estando em minha casa, de visita, ficou meio perplexo pelo fato de eu colecionar, em duplicatas, as primeiras edições de seus livros regionalistas. Ele não conservava nenhuma.


As poucas vezes em que saiu do Rio Grande do Sul foi para integrar bancas examinadoras em concursos para a cátedra superior, em outros Estados. A província lhe bastava, embora nada tivesse de provinciano. Recebeu a vida inteira, de seu livreiro parisiense, as novidades literárias, filosóficas e jurídicas que lhe interessavam.


Refugiava-se em casa, fechando-lhe as portas ao mundanismo e às exteriorizações da vida literária, não aos seus alunos a aos seus amigos. E tendo sentimento religioso, não precisava ir à igreja, poia a levava dentro da alma.


(Janeiro, 1979)


Capa: Jairo Devenutto

Fonte: Reverbel, Carlos. Saudações Aftosas. Porto Alegre, Martins Livreiro, 1980, p. 89/91.

domingo, 26 de fevereiro de 2023

Um inglês e o trem (Carlos Reverbel)

Um dia desses tive de acompanhar um inglês em viagem pela nossa campanha. Era um gringo de aparência rabicunda e porte avantajado. A olho, dei-lhe dois metros e pico. Até aí, nada de extraordinário. O espanto apareceu quando assentei o olhômetro na direção dos pés do vivente. Calçava sapatos 54, conforme ele próprio me informaria, ali pelo Pantano Grande.


A viagem ia correndo linda no mais, até começar a chover canivete aos baldes. Os raios caiam guaxos e acolherados. Santa Bárbara! São Jerônimo! E era água que Deus mandava. Não podia ser diferente: ficamos ilhados numa estância na costa do Ibicuí da Armada.


Os percalços não foram poucos, já se vê. E o inglês sempre firme, tirando tudo de letra, na maior desportividade. Só uma coisa o preocupava: ficar retido naqueles confins, perdendo a reunião com o ministro Cirne Lima, a que devia comparecer no dia seguinte, em Porto Alegre. Negócio grande, de importação de gado. Por sinal South Devon, a melhor raça europeia para cruzar com as zebuínas.


De carro não dava para sair. “Mas não seja por isso”, disse o fazendeiro. E providenciou na nossa remoção, a cavalo, até uma estação ferroviária, situada nas circunvizinhanças, coisa assim de três léguas de beiço, isto é, das grandes. Tocou para o inglês um pingaço baio cabos-negros, marca do Dr. Oswaldo Carlos de Oliveira Souza. No trote chasqueiro e alguma galopeadita daria para pegar o trem noturno na estação São Lucas. “Thank you, very much”. Era o inglês agradecendo, no soflagrante da despedida, a famosa “hospitality” gaúcha.



Por volta das 11 p.m. (como dizem os britânicos) apareceu o trem noturno se desmantelando e botando os bofes pela janelinha do maquinista, na falta daquelas provectas chaminés marca Maria Fumaça, de saudosa memória. Como manda a pragmática, vinha com umas duas horas de atraso. Na plataforma da estação cabia apenas a locomotiva, o bagageiro, o carro de segunda e o carro-boteco, por alcunha restaurante. O grosso da composição ficou estendido ao longo da linha, com os degraus de cada vagão lá em cima, longe do chão.


Fazia uma noite de breu, dessas de até vaga-lume errar o caminho e perder a direção do voo. A eletrificação rural que servia à estação era representada por um liquinho, que bruxuleava, qual vela de sebo melhorada, a uns 80 metros do vagão-evereste que tínhamos que escalar, praticando alpinismo na escuridão do pampa. E o inglês comendo tudo em tranca, aguentando tudo no osso do peito, na desportividade de sempre. Tudo para ele estava “very, very good”. E só tirava o cachimbo da boca para dizer OK.



Não seria por falta de ponto de apoio nos seus pés tamanho 54, mas o caso é que, ao escalar o vagão, qual jovem audaz do trapézio volante, o patrício de Sir Winston Leonard Spencer Churchill errou de degrau, recebendo em consequência um rasgão de palmo na calça de flanela branca e um talho de bom tamanho na canela esquerda. Quando chegamos na cabine que havíamos conseguido, engraxando as unhas do camareiro no unto de opípara gorjeta, o imperturbável britânico estava em petição de miséria, mas o seu moral continuava o mesmo, “very, very good”.


Como é de bom tom, logo assumi ares de “gentleman” e fui me apossando com desenvoltura do leito de cima, mesmo porque o meu companheiro, já desastrado na primeira, não estaria em condições de praticar nova acrobacia. O inglês ficou no leito inferior, menos sacolejante. E depois de procurar acomodar-se o melhor possível, não teve outro jeito senão optar pela clássica posição ginecológica. Instalou-se de barriga para o ar, mãos cruzadas na nuca, joelhos soerguidos, pernas abertas em leque, olhos piscos e pervagantes. Experimentou diversas posições (inclusive o decúbito dorsal), mas foi a ginecológica a única que lhe permitiu caber dentro do leito, uns 30 centímetros mais curto do que a sua simpática e avantajada pessoa. E assim fez todo o percurso, chegando ao seu destino (aliás, o nosso), de peito aberto e camisa arremangada, pois estava fazendo um calor de rachar, embora o dia anterior fosse de rigoroso inverno. Mas o inglês não parava de repetir: “Your climate, very, very good”.


Ia esquecendo: antes de despedir-se ele declarou que iria primeiro ao Pronto Socorro, para tomar uma antitetânica tamanho-família, recolhendo-se depois ao City Hotel, para espichar as “legs”.


Tenho para mim que este pequeno episódio ferroviário constitui uma das melhores demonstrações de subdesenvolvimento que poderíamos ministrar a um estrangeiro. Resolvi contá-lo depois que li umas declarações em que o responsável pelo setor, no Rio Grande do Sul, diz não ser da competência da ferrovia o transporte de passageiros para o interior do Estado.


Diante disso e depois disso, como dizia o Conselheiro Rui Barbosa nas suas perorações, talvez seja o caso de transferir-se o problema ferroviário para a área da respeitável matrona assaz conhecida como vó do Badanha.


(Maio, 1979)



Capa: Jairo Devenutto

Fonte: Reverbel, Carlos. Saudações Aftosas. Porto Alegre, Martins Livreiro, 1980, p. 40/42.


Crédito Fotos:

Ruínas da estação de São Lucas em 2005. Foto Daniel Taschetto

http://www.estacoesferroviarias.com.br/rs_uruguaiana/fotos/slucas051.jpg


Pátio de São Lucas em 2021. Foto Augusto Taschetto

http://www.estacoesferroviarias.com.br/rs_uruguaiana/fotos/saolucas0211.jpg


quarta-feira, 22 de fevereiro de 2023

O avesso da pele (Jeferson Tenório)

 

(…) a fuga (…) serve apenas para os indiferentes, para os que não sentem remorso.


(…) as relações afetivas são formadas por duas categorias: dos egoístas e dos doadores.


A infância nos fornece certas mágoas e é com elas que lutamos.


(…) o abandono é algo da maior crueldade que um ser humano pode causar ao outro.


A gente tem sempre que descobrir de onde vem a culpa, porque é assim que a gente aprende a partir, (…)


(…) nós sempre pensamos no lado negativo quando estamos em crise.


(…) a crise é o melhor momento das nossas vidas, porque é quando nos reavaliamos, quando fazemos uma autocrítica. E o melhor disso é que, quando a crise passa, tudo fica melhor. São as crises que nos levam adiante.


(…) sempre nos tornamos infantis diante do desespero e da humilhação.


(…) a morte pode ser inesperada, mas as palavras não.



Capa: Alceu Chiesorin Nunes

Imagem de capa: Antonio Obá, trampolimbanhista, óleo sobre tela, 130x 110 cm, 2019. Collection De Vleeschouwer-Pieters. Cortesia do artista e de Mendes Wood DM São Paulo, Bruxelas, Nova York. Reprodução de Bruno Leão.

Fonte: Tenório, Jeferson. O avesso da pele. 1ª ed. - São Paulo: Companhia das Letras, 2020, p. 40/46/47/84/98/178.

sábado, 11 de fevereiro de 2023

Idosos em Corpos de Jovens (Hoje Tem Podcast/Leila Germano)




Disponível: https://open.spotify.com/episode/4UX7N7YDxkao8A4Jk0sLdf

Acesso: 11/02/2023



Crédito imagem episódio: https://d3t3ozftmdmh3i.cloudfront.net/production/podcast_uploaded_episode400/1875086/1875086-1675699758008-379ed2ffc353.jpg



Crédito logos bingo: 

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Destaques de Dois Irmãos (MIlton Hatoum)

(...) as palavras parecem esperar a morte e o esquecimento ; permanecem soterradas, petrificadas, em estado latente, para depois, em isen...