sexta-feira, 31 de dezembro de 2021

É ANO NOVO! Colaboração de Luiz Carlos Wentz (2011)

 

Apesar de Deus lhe dar todo dia uma chance de agradecer, mudar, melhorar e recomeçar, você como bom ser humano que é… Insiste em esperar o início de um novo ano para por isso em prática, pois então prepare-se… Dentro de algumas horas será dada a largada…


Com o espírito do “Cara” Roberto Carlos… “Se chorei ou se sorri, o importante é que emoções eu vivi…”


É, meus amigos, nem tudo foram flores, mas o importante é que eu vivi e espero que vocês o tenham vivido também, pois nada mais triste do que apenas passar por esta vida sem ter vivido…


É ANO NOVO!


Chega um tempo na vida da gente que sentimos a necessidade de mudar…

Deixar para trás coisas muito enraizadas e profundas, mas que já não nos servem mais.

Então surge a ideia de lançar um novo olhar, em todos os sentidos!

Podemos fazer isso como se fôssemos mudar de casa…

Quem sabe encontrar um lugar de ruas estreitas que precisamos percorrer…

Localizado em ladeiras íngremes, para utilizarmos de nossa força e persistência…

Ou ainda…

Apenas simplificar, ficar no mesmo lugar, resgatar o velho, talvez…

Mas acima de tudo, criar um novo lugar!

Pois muitas vezes não é preciso mudar de casa, apenas olhar com outros olhos para dentro dela.

Quem sabe, olhando melhor, possamos ver, como se visualizássemos um rio com águas transparentes, que leve embora as preocupações que não nos interessam mais e que espelhem o nosso interior!

Quanto aprendizado podemos resgatar, basta aquietar e rememorar…

Olhar para nós, nossa casa, requer coragem e força… Enxergar o que precisa ser mudado, se desapegar do antigo… Olhar fundo… Sem ressentimento!

E se a angústia bater a porta, atendê-la – ela só vem avisar que é necessário mudar, desapegar-se…

E quando isso acontece, nos leva a situações caóticas, mas valiosas; com a reforma e as mudanças, um turbilhão de sentimentos, medos e expectativas nos invade…

E passar por tudo isso, fará você ver que vale a pena, como o clarear de um novo dia…

Nessa nova casa, nova morada, erga-a com água por perto, para amolecer a argila seca, que são as suas crenças, rigidez e incompreensão…

Você pode colori-la ou não, mas um lugar mais alegre é bem melhor…

Construí-la com arcos para enxergar o que realmente precisa se ver e pontes que aproximem e que ajudem a transpor os problemas e ressentimentos, transformando e dando-nos uma nova visão…

Ao invés de muros altos que escondem e afastam. Pois lembre-se: muros afastam, pontes aproximam…

A escolha é… Caminhar só e silenciosamente por lugares desconhecidos, ou nos aproximarmos mais de quem e do que realmente o valha?

A hora de mudar, recomeçar ou reformar… É nossa responsabilidade, somos donos dela…

Com certeza não é, nem nunca será fácil… Mas pense que, sempre valerá a pena,

MUDAR!


E para o Amor…


Amar


Fechei os olhos para não te ver

e a minha boca para não dizer…

E dos meus olhos fechados desceram lágrimas que não enxuguei,

e da minha boca fechada nasceram sussurros

e palavras mudas que te dediquei…

O amor é quando a gente mora um no outro.


Mario Quintana


Colaboração de Luiz Carlos Wentz (2011)

quinta-feira, 23 de dezembro de 2021

Prejuizos Populares (Cabrião)

 

Quando o gallo canta de dia, é máo agouro, e se canta ás deshoras é signal de casamento.


Quando sáhe o Senhor e muita gente o acompanha, o doente não escapa.


Virando-se um banco de pernas para o ár, treme o inferno.


Quando canta a coruja nas proximidades de uma habitação, é signal de morte. Para matar a ave agoureira, basta virar um tamanco.


Quando um cão esgravata o sólo, é signal de que alguma sepultura tem de ser aberta.


Quando uma mulher tem difficuldade de dar á luz, deita-se-lhe na cabeça um chapéo de homem, e a criança nasce logo.


Para evitar a palestra de algum amolador, espeta-se uma thesoura na parede.


Desejando-se que haja chuva, mata-se um sapo; e para fazel-a cessar, é bastante fincar um espeto n’um cinzeiro.


Para evitar o contagio das molestias, pensam os roceiros, que não ha nada como queimar aquella cousa de vacca.


E’ mister guardar com muito cuidado o umbigo das crianças, porque se algum rato o come, ficam ladras.


Para que os recem-nascidos não sejam chupados pelas bruxas, faz-se um signo de Salomão na porta do aposento.


Se chove e ao mesmo tempo faz sol, é que a rapoza se está casando.


Quando ha eclipse do sol, rufa-se em caixas, para espantar o leão que está comendo a lua.


Na noite de S. João, quem rezar o Padre Nosso e o Credo, póde passar descalço, por cima de um brazido sem se queimar.


Se um rapaz tenciona casar-se com certa dama, na mesma noite planta um dente de alho; se este bróta no dia seguinte, o casamento é infallivel.


O vestido do noivado, nunca deve ser tinto de preto, porque se o tingem, morre a noiva.


E’ de mau agouro dormir com os pés voltados para a rua.


Não se deve varrer a casa de noite e atirar o cisco fóra, porque enxota-se a fortuna.


Vestir roupa pelo avêsso, livra da mordedura de cão damnado.


E quem lêr tudo quanto fica escripto, váe para o céo direito que nem um fuzo, ainda que os jesuitas não queiram.




Fonte: Cabrião: semanário humorístico editado por Ângelo Agostini, Américo de Campos e Antônio Manoel dos Reis: 1866-1867. Ed. fac-similar/introdução de Délio Freire dos Santos. São Paulo: Imprensa Oficial do Estado: Arquivo do Estado, 1982, p. 39.


Reprodução fac-similar do original de 51 fascículos, publicado em São Paulo no período de 30 de setembro de 1866 a 29 de setembro de 1867.

Charada (Cabrião)

 

Fui manso como um cordeiro,

Alvo, puro, immaculado;

Fui dos homens o primeiro,

Embora sanctificado.


No fundo abysmo da terra,

Nas entranhas sepultada,

Vivo, se é que vida encerra,

Pobre pedra abandonada.


CONCEITO


Sou da raça que proscripta,

Sobre a terra vive errante;

Sou dessa raça maldicta,

Qu’inda quer ir por diante.


Fonte: Cabrião: semanário humorístico editado por Ângelo Agostini, Américo de Campos e Antônio Manoel dos Reis: 1866-1867. Ed. fac-similar/introdução de Délio Freire dos Santos. São Paulo: Imprensa Oficial do Estado: Arquivo do Estado, 1982, p. 39.


Reprodução fac-similar do original de 51 fascículos, publicado em São Paulo no período de 30 de setembro de 1866 a 29 de setembro de 1867.

Definiçoes (Cabrião)

 

AMOLADOR. – Sugeito que passa a navalha no rebôlo.

Indivíduo que nos pôe em tratos a paciencia.


BURRO. – Animal modesto.

Sugeito de craneo expesso.


CONVENTO. – Armazem de alcaides.

Morte de capitaes.

Reunião de vadios.

Amostras de cachaços.


MENINO. – Homem quando petiço.

Sugeito finorio.


PE'. – Base de todas as cousas.

Deposito de calos.

Consummidor de sola.

Remate da perna.


PENA. – Sentimento de dor.

Capote das aves.

Azorrague dos patifes.

Condemnação dos criminosos.


QUEIJO. – Borra de leite.

Sugeito aparvalhado.

Fabrica de esquecimentos.

Complemento das sobremesas.


QUEIMADOS. – Assucar reduzido á pilulas pegajosas.

Individuos contemplados com alguma mecha ofertada pelo Cabrião.

Sugeitos que se chegaram demais ao fogo, ou o fogo á elles.

Quitutes cozidos além do necessario.

Uma povoação do Rio de Janeiro.


ROLHA. – Meio descoberto para tampar garrafas.

Instrumento que faz emmudecer os palradores.


Fonte: Cabrião: semanário humorístico editado por Ângelo Agostini, Américo de Campos e Antônio Manoel dos Reis: 1866-1867. Ed. fac-similar/introdução de Délio Freire dos Santos. São Paulo: Imprensa Oficial do Estado: Arquivo do Estado, 1982, p. 71.


Reprodução fac-similar do original de 51 fascículos, publicado em São Paulo no período de 30 de setembro de 1866 a 29 de setembro de 1867.

MANDAMENTOS DO HOMEM DE TRETAS (Cabrião)

 

1.° Amar o dinheiro sobre todas as cousas, e o próximo como a nós mesmos.


2.° Não empregar o seu valor em vão.


3.° Guarda-lo nos Domingos e festas de guarda.


4.° Nega-lo ao pai e á mãi.


5.° Não matar pobres.


6.° Affectar castidade.


7.° Não furtar pouco.


8.° Não levantar falsos testemunhos sem lucro.


9.° Não desejar o interesse do próximo.


10. Não pensar que ha cousas alheias.


Estes dez mandamentos se encerram em dous:


« Amar o dinheiro sobre todas as cousas, o do próximo como a nós mesmos. »


Fonte: Cabrião: semanário humorístico editado por Ângelo Agostini, Américo de Campos e Antônio Manoel dos Reis: 1866-1867. Ed. fac-similar/introdução de Délio Freire dos Santos. São Paulo: Imprensa Oficial do Estado: Arquivo do Estado, 1982, p. 75.


Reprodução fac-similar do original de 51 fascículos, publicado em São Paulo no período de 30 de setembro de 1866 a 29 de setembro de 1867.

O beijo (Cabrião)


Beijo na face

Pede-se, e dá-se,


Dá?


Que custa um beijo?

Não tenha pejo!


Vá!


Um beijo é culpa,

Que se desculpa:


Dá?


Um beijo é graça,

Que a mais não passa:


Vá!


Teme que a tente?

E' innocente:


Dá?


Guardo segredo,

Não tenha mêdo:


Vê?


Dê-me um beijinho,

Dê, de mansinho,


Dê!


Fonte: Cabrião: semanário humorístico editado por Ângelo Agostini, Américo de Campos e Antônio Manoel dos Reis: 1866-1867. Ed. fac-similar/introdução de Délio Freire dos Santos. São Paulo: Imprensa Oficial do Estado: Arquivo do Estado, 1982, p. 78.


Reprodução fac-similar do original de 51 fascículos, publicado em São Paulo no período de 30 de setembro de 1866 a 29 de setembro de 1867.

Epistola familiar (Cabrião)

 

SÃO PAULO, 11 DE DEZEMBRO DE 1866.


Meu querido Gedeão

Das Tramoyas Cansanção.


Ha muito, presado amigo,

Dos meus males doce abrigo,

Pretendia eu novas dar-te

D'esta Patria do Deus Marte;

Porém sempre perseguido,

Pelo fado fementido,

Vivo tão atropelado,

De trabalho estenuado,

Que nem sei como mastigo

As torradinhas de trigo,

Com que dou conforto ao peito,

Já das magoas tão desfeito.

Bem sei eu, que a velha historia,

Por querer turbar a gloria

Aos preclaros descendentes

Dos heroes armipotentes

- Cubas, Pires e Buenos -,

Que venceram Turcos, Brenos,

Chinos, Persas, Anglicanos,

Fanfarroens heroes hispanos

- Sancho Pansa e Dom Quixote -,

A bodoque e chifarote,

Quer, por força, que o Deus Marte

Fosse nado em outra parte.

Eu, porém, protesto e juro,

Do que digo bem seguro,

Que a extrangeira historia mente;

Porque Marte é d'esta gente.

Inda mais, dizer-te quero,

Contra a voz do mundo fero,

Que as victorias d'esta terra

Quer lançar do lodo á berra,

Que São Jorge, o gram guerreiro,

Aqui viu a luz primeiro;

Que São Pedro, o pescador,

Aqui foi agricultor;

E São Paulo, o cabalista,

Pela fama, foi Paulista.


Isto dito, á pressa embhora,

Tratar vou de mim aghora.

Sabes tu, bom Gedeão,

Como vive o cidadão,

Que, mettido entre fidalgos,

Como lebre ao pé de galgos,

Anda sempre amedrontado,

Que lhe-vão, sobre o costado,

Dar de rijo, com pujança,

Por amor da temperança;

Pois o pobre, por mania,

Vive sempre em gritaria

Contra os fóros da nobreza,

Que, arrogante, fera e teza,

Vai malhando na gentalha,

Que pisa, rosna e ralha...


De saude não vou bem;

De dinheiro,... nem vintém;

De namoros... menos mal;

Pois que, sendo jovial,

Não receio ser ferido

Pela setta de Cupido.


E, demais, meu Gedeão,

N'esta era do Balão,

Deve o homem namorar,

Que é negocio bem casar.


Quem pretende hury formosa,

Que em belleza, excede á rosa,

Na candura á neve algente,

Ou do Sol á luz nitente,

Anjo excelso de primores,

Mas sem dote – sem valores...

Será tudo, até beocio;

Nunca homem de negocio.


Tartaruga com dinheiro!...

Isso é vaso e outro cheiro;

Que bem vale o sacrificio,

Que redunda em beneficio;

Nescia ou tola, malcriada,

Ha de ser idolatrada;

Que, á hum noivo calculista,

Nada ha que dê na vista.

O desfructe é distração,

A sandice reflexão.

A feiura symphatia,

Seja torta, velha ou tia;

Pois lá diz o velho adagio,

Dos tartufos apanagio,

- Que o dinheiro tudo encobre

E defeito é só ser pobre-.


Por seu lado, as taes matronas,

Apesar de velharronas,

Soccoridas do postiço,

Que, de alcaides, é feitiço,

Fazem dar volta ao miolo

Do sagaz tartufo ou tolo.


Vê-se aqui cada magriça,

Com formato de linguiça,

Repimpada atroz perúa,

Roçagante pela rua,

Embrulhada em fino raz,

Preza ao braço de hum rapaz,

Tam himpante, tam pimpona,

Que parece huma Amazona,

Ou singrante Náo de Aveiro

Rebocada por Saveiro!

Que rotunda matronaça,

Para quem parece escaça

Toda a terra Americana,

Desde o Prata até Goyana!


Sem postiço a magricela

Dá seus ares de gazela,

De raposa ou velha gata;

Mas, vestida, oh, que Fragata!

Tem postigos, portinholas,

Suspensorios, sugigolas,

Ferros, mastros, cordoalhas,

Encrespadas maravalhas,

Bordas falsas, cabrestantes,

Sondas, boyas e oitantes,

Bujarronas, vela-grande,

Em que o vento audaz se-espande;

Chaminé, carvão e gaz,

Breu, azeite e agua-raz;

Por botinas duas lanchas;

Os dois pés servem de pranchas;

Lenha, estopa, o alcatrão,

Tudo embaixo do Balão!


A garbosa rapazia

Não se-deixa em calmaria:

Cabelleiras, garbinados,

Chapéos pretos, niveos, pardos,

Pince-nez de toda a casta,

Parvoice muito vasta,

Calça larga, á porcalhota,

Gravatinhas de janota,

Tudo tem, com abastança

Quem se-trata com chibança.


Viva a moda, meu amigo,

Morra tudo que é antigo!


Deixa a roça, Gedeão,

Basta já de ser poltrão

Anda: vem para a cidade,

Traz a tua F'licidade,

A Marica, a Josephina,

Bella rosa purpurina.

Quero vel-as estufadas,

De tundás com almofadas,

Rochunchudas e galantes,

Quaes repolhos ambulantes.

Segue a moda e o progresso;

Volta as costas ao regresso.


E' a moda o salvaterio

Dos que a-buscam com mysterio;

Da velhota inconsolavel,

Do janota desfrutavel,

Que campando de galante,

Mostra a todos que é pedante;

Do pansudo sem juizo,

Que com ella cobra o sizo;

Té no próprio Pio nono,

A moda ferrou tal mono,

Que, de humilde franciscano

O-tornou republicano!...

E mais tarde, por magana,

Revirou-o, com tal gana,

Que dos Reis, irmão querido

Fez o Papa fementido.


Modas ha com tal fartura,

Que parece já loucura:

Chapellinhos á franceza,

Babadinhos á turqueza,

Largas mantas, á romana,

Penteados á sultana,

Capotinhos, sedas frouchas,

Franjas, pentes, rendas, trôchas;

Lindas flores indianas,

Molas d'aço, barbatanas,

Para erguer seios cahidos

E fazer guapos vestidos.


N'estes tempos, meu querido,

E' que vale ser marido.

Vê lá tu, que és hum mestraço,

Com teus visos de madraço,

Si não é hum grande achado

Este meu enunciado.

E si pescas da sciencia,

Nota bem a consequencia:

Sabe o marido, coitado,

Pela esposa fulminado,

Vai á loja da Madama,

Que é modista d'alta fama,

Compra leques, luvas, cheiros,

Traz comsigo seis caixeiros,

Carregados de chocalhos,

Que não valem cascas d'alhos,

E, de amores transportando,

Sem se-ver pobre e pellado,

Chama a Eva portentosa,

Que vem toda vaporosa,

De cabello esparralhado,

Vestido longo arrastado,

Bocejando, com desdem,

Como quem mil contos tem,

Ergue os olhos molemente;

Encara o pobre demente,

E, com ar de gran Sultana,

Brada ao tal José-Banana:

« Inda aqui não vejo tudo!

« Que é da capa de velludo?

« O vestido de chalim?

« O toucador de marfim?

« O corpinho decotado?

« O mantellete bordado?

« Pois eu hei de ir ao Cantante

« Sem pulseira de brilhante?

« Ande. Vá buscar o resto,

« Que, se não, já lhe-protesto,

« (Isto diz rufando as patas)

« De o-mandar plantar batatas!...»


E que tal, meu Gedeão,

Te-parece este sermão?


Vou casar-me, quanto antes,

Para ter destes instantes.


Depois d'isto a consequencia,

Que nos-mata a paciencia:

Muito filho malcriado,

Muito cueiro perfumado,

Choros, berros, gritaria;

Vem depois a estrepolia,

As escholas, os collegios,

E mais outros privilegios,

Que o papae ha de pagar,

Sem tugir, nem resmungar.


Quando quer a negra sorte,

Hum capricho da consorte,

Que, por artes do demonio,

Ou encantos de Trophonio,

Torce a orelha e poem cabana

Ao marido, que é pastrana;

E com labia e com geitinho

D'elle faz hum coitadinho...


De outras cousas, Gedeão,

Inda cá tenho porção.


De politica não fallo.

Pois que é sino sem badalo,

Em que vai qualquer tarelo

Repicar com seu martelo:

E' negocio de velhacos,

Que só serve para os Cacos.


Do Papado nada digo,

Vivo alheio, charo amigo,

A' batina e á corôa,

nN'isto sempre andei atôa.


Faço ponto, Gedeão;

Até outra occasião.

Não te-zangues da maçada,

Que já vai mui prolongada;

E dispoem, si assim te apraz,

Do teu velho

                BARRABRAZ.


S. Paulo – 1866 – Typ. IMPARCIAL


Fonte: Cabrião: semanário humorístico editado por Ângelo Agostini, Américo de Campos e Antônio Manoel dos Reis: 1866-1867. Ed. fac-similar/introdução de Délio Freire dos Santos. São Paulo: Imprensa Oficial do Estado: Arquivo do Estado, 1982, p. 95.


Reprodução fac-similar do original de 51 fascículos, publicado em São Paulo no período de 30 de setembro de 1866 a 29 de setembro de 1867.

Differença de Ladrões a Ladrões (PADRE ANTONIO VIEIRA/Cabrião)


O ladrão que furta para comer, não vae nem leva ao inferno; os que não só vão, mas levão, de que eu trato, são outros ladrões de maior calibre, e de mais alta esphera, os quaes, debaixo do mesmo nome e do mesmo predicamento, distingue muito bem S. Basilio Magno: não são só ladrões, diz o sancto, os que cortão bolsas, ou espreitão os que se vão banhar, para lhes colher a roupa; os ladrões que mais e dignamente merecem este titulo, são aquelles a quem os reis incommendarão os exercitos e legiões, ou o governo das provincias, ou a administração das cidades, os quaes, já com manha, já com força, roubão e despojão os povos.


Os outros ladrões roubão um homem, estes roubão cidades e reinos; os outros furtão debaixo do seu risco, estes sem temor, nem perigo; os outros, se furtão são inforcados, estes furtam e inforcão.


Diogenes, que tudo via com mais aguda vista que os outros homens, viu que uma graude tropa de varas e ministros de justiça levarão a inforcar uns ladrões, e começou á bradar: « lá vão os ladrões grandes a inforcar os pequenos. »


Ditosa Grecia, que tinha tal prégador! E mais ditosa as outras nações, se nellas não padecera a justiça as mesmas affrontas! Quantas vezes se viu em Roma ir a inforcar um ladrão por ter furtado um carneiro, e no mesmo dia ser levado em triumpho um consul ou dictador, por ter roubado uma provincia! E quantos ladrões terião inforcado estes mesmos ladrões triumphantes? De um chamado Seronato disse com discreta contraposição Sidonio Apollinar: Seronato está sempre occupado em duas cousas: em castigar furtos, e em os fazer. Isto não era zelo de justiça, senão inveja. Queria tirar ladrões do mundo, para roubar elle só!


PADRE ANTONIO VIEIRA.


Fonte: Cabrião: semanário humorístico editado por Ângelo Agostini, Américo de Campos e Antônio Manoel dos Reis: 1866-1867. Ed. fac-similar/introdução de Délio Freire dos Santos. São Paulo: Imprensa Oficial do Estado: Arquivo do Estado, 1982, p. 111.


Reprodução fac-similar do original de 51 fascículos, publicado em São Paulo no período de 30 de setembro de 1866 a 29 de setembro de 1867.

Epistola Amorosa. (Cabrião)


ELEITA de minh'alma.


Ha um « quatrienio » que uma paixão ardente traz-me em continua « cabala » para que eu deponha na « parochia » de voss'alma a adoração soberana que, em segredo vos tenho « votado ». Hoje porem, que a par d'aquelle appareeu-me, em « carga cerrada » o sentimento do desespero formando uma « duplicata » horrivel e perigoza para minha existencia, vejo-me collocado na melindrosa « situação» de dirigir-vos esta « cedula », filha « genuina » do meu pensar, para que a vossa resposta venha tirar-me da incerteza em que vivo de ser ou não um « fosforo » ante a « urna » de vosso peito.


Sim, minha querida, é a vossa imagem unicamente que trago gravada na « chapa » do meu coração, e acreditai que todo o meu « desideratum » resume-se em um doce hymineu que venha inaugurar uma verdadeira « conciliação » entre a minha e a vossa vida.


Peço-vos que acrediteis na puresa das palavras que vos dirijo, e que « apurando-as » devidamente » não convertais a santidade dos « principios » que as ditão, em « arguciósa politica » empregada pelo méro desejo de fazer « triumphar » a « candidatura » que ora manifesto á posse de vossa mão. « Violentar » por semelhante fórma o « vosso voto » em favor de « minha causa » seria procceder indignamente!! Aguardo pois o resultado de vossa decisão na certeza de que julgar-me-hei o mais feliz dos homens se por ventura conhecer que sou « eleito » pelo « circulo » de vosso coração, e o mais desgraçado dos mortaes se uma « derrota » vier convencer-me de que sou uma nihilidade, « politicamente » fallando.


Vosso candidato natural.


X.


Fonte: Cabrião: semanário humorístico editado por Ângelo Agostini, Américo de Campos e Antônio Manoel dos Reis: 1866-1867. Ed. fac-similar/introdução de Délio Freire dos Santos. São Paulo: Imprensa Oficial do Estado: Arquivo do Estado, 1982, p. 119.


Reprodução fac-similar do original de 51 fascículos, publicado em São Paulo no período de 30 de setembro de 1866 a 29 de setembro de 1867.

Destaques de Dois Irmãos (MIlton Hatoum)

(...) as palavras parecem esperar a morte e o esquecimento ; permanecem soterradas, petrificadas, em estado latente, para depois, em isen...