Ao aproximar-se a realização de mais uma edição da SEARA, naturalmente me vêm à lembrança os fatos que fizeram com que o festival de Carazinho surgisse e quase de imediato se transformasse num dos melhores e maiores acontecimentos anuais da música regionalista gaúcha.
O primeiro a me falar sobre a
possibilidade da realização de um festival em minha terra natal foi o Luiz
Araújo, cunhado do Rillo, que deixara “Os Angueras” e São Borja para alçar-se
mais em sua carreira no Rádio, acolhendo proposta da Rádio Carazinho, onde
continua até hoje. Cabreiro e cheio de voltas ele chegou, em certo dia cuja
data nem me lembro, na antiga sede do IGTF, na Rua Sarmento Leite e assim como
quem não quer nada foi desatando a ideia, que julguei inviável, em princípio.
Não demorou muito e foi a vez do
Aylton Magalhães, então gerenciando a Rádio Carazinho, quem me procurou, de
forma bem mais precisa e insistente. E como todas as objeções que eu ia
colocando eram refutadas com veemência, senti que da sondagem inicial feita
pelo Araujo, à segunda abordagem que me fazia sobre o assunto o Aylton, ganhara
corpo e consistência a ideia da realização do festival em Carazinho e que ele
sairia com ou sem a minha ajuda. E resolvi, de forma matreira, condicionar meu
apoio e o do Instituto mediante algumas condições que em seguida coloquei, de
forma até certo ponto impositiva. E como o Aylton concordasse com elas,
fortaleceu-se a iniciativa. Logo depois surgiu a SEARA, que de pronto posicionou-se como um festival interessado,
realmente, em valorizar e, mais do que isso, reconhecer o valor dos autores,
compositores e intérpretes musicais, transformando, em Carazinho, os
verdadeiros “fazedores dos festivais” como personagens mais importantes do
evento.
Já naquela época – seis anos
passados – dificilmente havia alguém, no Estado, que tivesse acumulado tantos
conhecimentos e experiências quanto eu havia amealhado desde o período que
antecedeu ao próprio surgimento da Califórnia da Canção Nativa, em cujos lances
iniciais tive alguma participação, como Secretário que era da Estância da
poesia Crioula.
Esses conhecimentos e
experiências, aliados àqules que possuía a equipe do IGTF foram todos voltados
para a SEARA, o primeiro dos festivais a aceitar uma participação mais estreita
do órgão estatal na elaboração de normas que se voltassem para a realização de
um festival que mostrasse à evidência o desenvolvimento da música regional
rio-grandense, e permitisse a presença de suas tendências mais evolutivas, sem,
contudo, desfigurar suas origens, sem fugir de suas raízes.
Os esforços dos meus conterrâneos
foram largamente compensatórios, pois ninguém, no Estado, desconhece que a
SEARA é primorosa na organização, séria e absolutamente honesta na sua
realização e que assumiu uma nova forma de comportamento com aqueles que são,
realmente, os mais importantes em qualquer evento musical: os criadores e
difusores da música rio-grandense.
O exemplar tratamento dispensado
aos autores, compositores e intérpretes instrumentais e vocais desde sua
primeira edição e o convívio salutar, indiscriminado, entre organizadores,
comissões julgadoras e participantes do festival, fizeram com que a SEARA
assumisse imediatamente um lugar de destaque no cenário festivaleiro gaúcho e
tivesse, em seguida, seguidores, gerando, em consequência, melhoras sensíveis
em diversos outros eventos similares.
Verdadeiro laboratório de ideias,
a SEARA inovou consideravelmente em diversos aspectos regulamentares e na forma
executiva dos festivais, sendo que das inúmeras experiências colocadas em
prática, todas aquelas que resultaram positivas foram repassadas, através do
IGTF, aos demais festivais gaúchos.
Preocupada em defender a classe
musical, a SEARA, a partir de 1984 criou, paralelamente ao evento, um encontro
cultural que se denominou “Chamamento Cultural da SEARA”, no qual os principais
problemas da classe passaram a ser discutidos. E o próprio ACORDE BRASILEIRO –
SEMINÁRIO NACIONAL EM DEFESA DA MÚSICA REGIONAL BRASILEIRA a realizar-se de 11
a 14 de dezembro próximo em Tramandaí, promovido pelo IGTF e pela
municipalidade daquela comuna é, em grande parte, resultante dos debates
acontecidos em Carazinho.
A SEARA cresceu com a ajuda de
muitos e aqueles que a fizeram devem lutar para mantê-la no pedestal onde se
encontra, impedindo que o “Chamamento Cultural” desapareça e que ao seu palco
compareçam, nos espetáculos programados, apenas aqueles que efetivamente têm
dado uma profícua colaboração e conteúdo à nossa música, coisas que,
infelizmente, por falta de maiores cuidados do grupo dirigente, em Carazinho,
não acontecerão este ano, mas que serão, certamente, resgatados na próxima
edição.
Fonte:
Revista Tarca – Cultura Gaúcha – ANO III – Nº 16 (Ago/Set/Out/1986) – p. 34
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