“ORELHA” por Fausto J. L. Domingues
O doutor Ápio Cláudio Beltrão, com sabedoria e proficiência, entrega-nos paciencioso relato de sua vivência juvenil e dos seus posteriores estudos a respeito de pouco conhecidos aspectos da nossa antiga saga ferroviária. Enquanto empreendia a leitura atenta do seu texto, sempre lúcido e desdobrado com desvelo, muito prazerosamente, vinham-me à lembrança inesquecíveis momentos e circunstâncias da mesma época. Enternecidamente, nitidamente revelados, relembrava aqueles sítios que assinalaram, de forma inconfundível, a minha infância e juventude. Dois centros ferroviários, Cacequi e Santa Maria, unidos pela linha férrea, mas, sobretudo, pelos laços afetivos do coração. As gares, as oficinas, os depósitos, as vilas contíguas, a cooperativa, as casas de saúde e farmácias, as escolas, os clubes sociais e de futebol, a política, os funcionários, desde os tucos e carregadores de malas aos gerentes de estação e chefes de trem, tudo e todos vivendo em seu próprio mundo social, amalgamados pela inquieta e fremente alma ferroviária. Enxerguei-me em plena viagem entre a casa paterna e o colégio marista, naquele comboio, conduzido por possante locomotiva, que, enquanto deixava para trás fumaça e fuligem, também carregava, além do cheiro do carvão de pedra, esperanças e saudades. Pela janela, olhar contemplativo, o desfile efêmero de conhecidas imagens que, hoje, na fugacidade da memória, constituem apenas paisagens de sonho e ilusão. Os pequenos lugarejos, à margem da linha, tinham seu silêncio interrompido pelo áspero ringir do aço nos trilhos, pelo furor das locomotivas e pelos insistentes apitos que denunciavam a chegada e partida da velha Maria Fumaça. A recepção aos trens, em todas as estações, era festiva e festejada como ponto de encontro, pela busca de encomendas, de notícias, pelas visitas aguardadas e as de forasteiros com os mais diversos desígnios. A estrada semeou cidades e vilas, estimulou o desenvolvimento, empregou e alimentou famílias.
Faz-se indispensável anotar, todavia, que esta obra não é meramente evocativa; não é apenas revivência de surradas estampas do passado. Longe dos devaneios e das incursões saudosistas que também fascinam ao seu autor, este trabalho possui múltiplos significados e singular importância. Também não se restringe à simples contemplação das linhas férreas então existentes, mas observa, com rigor histórico, a evolução das ferrovias, os diversos ramais, as estações e paradas, além de um criterioso estudo sobre as locomotivas e máquinas a vapor. Didático, técnico, elucidativo, constitui também um alerta. É notória, na atualidade, a omissão de técnicos, estudiosos e historiadores a respeito desta questão. Enquanto em países desenvolvidos cuida-se do aprimoramento do seu desempenho, aqui, interesses políticos que atenderam e atendem às mais diversas e escusas conveniências, muito antes de mirarem os aspectos sociais, materiais, humanos e econômicos, surrupiaram o funcionamento, promoveram a supressão, inspiraram o descaso e obstaram um possível e desejável aperfeiçoamento da atuação ferroviária. Pela austeridade e ineditismo com que o assunto é versado, este trabalho tende a constituir-se em um chamamento à responsabilidade, à reflexão e uma justa homenagem aos tempos em que o velho trem de passageiros cortava as coxilhas do nosso Rio Grande.
“Três parágrafos” do Prólogo
As opiniões do autor resultam da reflexão sobre os dados momentaneamente disponíveis e, naturalmente, podem modificar-se à vista de novas informações, ou, mesmo, de meditações repetidas que levem à mudança de entendimento.
Além de atender à sua satisfação pessoal, o autor tem como objetivo proporcionar aos leitores uma visão preliminar do assunto abordado, de modo a que se sintam estimulados a ir mais além por seus próprios meios.
No entanto, se alguém se sentir tocado, por ocasião da leitura, pela recordação das impressões, talvez já um tanto esmaecidas, de momentos felizes passados junto a ferrovias, o mais sublime propósito desta obra foi atingido, sem a menor sombra de dúvida.
CONTRACAPA “Memórias Vivas”, de Leo Petersen Fett
Ruídos, cheiros, dezenas de janelinhas iluminadas, as linhas aerodinâmicas dos vagões Pullmann, com uma cor marrom escura, misturada com grafite e tons avermelhados, parecia que se dirigiam para a Lua ou para Marte… Também era costume de parentes dos viajantes acompanharem o trem de automóvel Caminho Novo afora, abanando freneticamente. Por fim, aquela imensa lagarta, com uma lanterna vermelha, o último vagão sumia à distância, soltando uma poeira e algumas brasinhas do cinzeiro entre os trilhos.
Os trens tinham nome: “O Passageiro”, “O Carga”, “O Lastro”, “O Giruá”, “O Cruz Alta”, “O Pagador”, e assim por diante. Também as locomotivas: a “241”. a “237” e a “249”, a “Manobrista”, a “Mallet”, a “Seiscentas”…
Uma nuvem de vapor se formava à saída das válvulas de segurança que chegava a envolver a própria locomotiva. Pois atravessávamos essa nuvem sentindo cheiro e vapor misturado ao cheiro de enxofre característico do nosso carvão de pedra, e ainda mais o zunidinho do escapamento da dita válvula de segurança.
Capa e Editoração: Priscila Pereira Pinto
Imagem da Capa: Locomotiva 806 da VFRGS. Museu do Trem, São Leopoldo/RS
Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)
B453I
Beltrão, Ápio Cláudio
As locomotivas a vapor e as ferrovias no Rio Grande do Sul / Ápio Cláudio Beltrão. Porto Alegre: Instituto Histórico e Geográfico do Rio Grande do Sul, 2017.
149 p.; ilustrado.
ISBN 978-85-62943-13-3.
1. Locomotivas. 2. Locomotivas a vapor. 3. História: Ferrovias: Rio Grande do Sul. 4. Material rodante. 5. Transporte ferroviário. 6. Ferrovias. 7. Estações ferroviárias. 8. Paradas ferroviárias. 9. Estradas de ferro. 10. Viação férrea: Rio Grande do Sul. I. Ápio Cláudio Beltrão. II. Instituto Histórico e Geográfico do Rio Grande do Sul. III. Título.
CDU 629.4
Bibliotecária: Márcia Piva Radtke.
CRB 10/1557
Crédito para o vídeo:
Projeto Nitratos Cinemateca Brasileira
“CEREMÔNIAS” E FESTA DA IGREJA EM SANTA MARIA ESTADO RIO GRANDE DO SUL
Festas de sagração e inauguração da Igreja Matriz Nossa Senhora da Conceição, em Santa Maria, Rio Grande do Sul, em 5 de dezembro de 1909. Saída do povo da Igreja pela ocasião da festa, da quermesse e da procissão.
Na estação de trem: a plataforma de embarque, os vagões de serviço, os passageiros e a locomotiva partindo.
Código FB: 840
Gênero: Não ficção
Categoria: Curta-metragem
Ano: 1910
Estado: RS
Cromia: BP
Disponível: https://www.youtube.com/watch?v=wNjCENtD7F0
Acesso 02/08/2025
Áudios trem: BBC Sound Effects: https://sound-effects.bbcrewind.co.uk/search?q=railway
Captura de Áudio:
SONY IC RECORDER ICD-PX312
Digitalização capa e contracapa:
EPSON L 395
Nenhum comentário:
Postar um comentário