SERGIO
FARACO
Pequenas ambições
T
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enho muitas despesas, que devoram
a receita, e outras tantas ambições, todas elas razoáveis, mas ai de mim,
caríssimas.
Diariamente, vou de Ipanema à
Tristeza. Para poupar combustível, engato a quinta marcha e não troco. Na lomba
da Vila Conceição, minha caranguejola tosse, engasga-se, treme, quase pára e
logo começo a ouvir os insultos de quem me ultrapassa, aqueles extremosos
filhos que vão tirar o pai da forca. É o modo que encontrei de só gastar vinte
mil-réis por semana. Em casa, igualmente em nome da economia, corto eu mesmo a
grama, limpo os canteiros, planto o que precisa ser plantado, varro o pátio,
pinto o que precisa ser pintado, conserto o que se desconserta, desentupo as
graxeiras, recolho o cocô do cachorro e por aí vai.
Por que me queixo?
Porque cansei. O cansaço é tanto
que, à noite, quando finalmente me sento à mesa para escrever, encosto a cabeça
nela e durmo. Chega de economia! Chega de pagar com moedas e depositar o troco
no porquinho! Minha ambição é contratar uma empresa que faça tudo o que eu
faço, inclusive a literatura. Terceirizar o serviço. Eles a trabalhar e eu só
pagando, não com as merrecas do porco, mas sacando na boca do caixa.
Essa ambição não é guaxa, tem
família.
Ao cruzar pelas revendas de
automóveis, admiro os carrões atrás do vidro e me pergunto quando, afinal,
terei o meu, como qualquer burguês. E no jornal, se leio a coluna social e vejo
aquela nobreza toda em Punta del Este, também me pergunto quando conhecerei
aquele paraíso oriental, eu, que só conheço o Lami.
Mais: quero uma sauna no puxado
atrás da casa e uma sala de ginástica que me deprima o barrigão, quero um
cabeleireiro de renome para fazer mechas e uma cirurgia para abreviar o nariz,
pois quanto mais passa o tempo, mais eu vejo pelo canto do olho seu
estrambótico perfil.
Quero um nariz grego!
E quero também uma Mercedes!
E quero sapatos Weston, de Paris!
E quero charutos H. Upmann!
E quero um terno Armani!
E quero uma capanga Louis Vitton!
E quero cuecas Hugo Boss!
E quero um monte de coisas mais.
Em síntese: quero o meu cartão
corporativo do governo federal ou o de débito do governo paulista. Ou, por
outra: já que é moleza, também quero ser ladrão.
Fonte: Segundo Caderno ZH
(2008)
Crédito da Foto: http://www.sergiofaraco.com.br/biografia.htm
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