sábado, 20 de maio de 2017

Política Cultural - Ideias e Propostas de um Poeta e Pensador (Luiz Coronel)

Atualidades

Política Cultural
Ideias e propostas de um poeta e pensador

Luiz Coronel


 1. A arte é uma expressão necessária e permanente do ser humano. Através dela o homem organiza sua emoção. Constrói seu testemunho. Deixa seu legado. Pergunta e responde o sentido da vida. Dimensiona maior a si mesmo e ao mundo que o rodeia. Onde existir uma comunidade de homens, mesmo a mais primitiva, aí se manifesta o “fazer artístico”.

 2. O maior inimigo da arte é o conceito de prioridades que pauta a ação de governantes e homens do poder. Para estes senhores a arte seria um deleite secundário, uma decoração, acabamento superficial, dengue, suspiro, divertimento secundário. Esquecem estes vetustos senhores que o mundo criado por suas equações, suas engrenagens, suas duplicatas e paredes, sucumbe e só a arte sobrevive.

 3. Quem era o prefeito de Londres ao tempo de Shakespeare? Os artistas permanecem na memória e no legado dos homens. Os pequenos governantes morrem com suas inquietações cotidianas.

 4. No Rio Grande do Sul, em particular e no Brasil em geral, a arte é um gesto heroico e desamparado. Os poderes públicos não têm conhecido a sua função de repassar recursos para promover, viabilizar, estimular a vida artística. Ou seja: se faz arte apesar do desestímulo do sistema.

 5. É urgente e necessário que músicos, bailarinos, homens e mulheres de teatro e cinema, artistas plásticos, escolas de samba, esporte amador, se reúnam e tragam ao novo governo que nascerá do ventre das urnas, em 15 de novembro, subsídios para uma nova política cultural.

 6. É fácil criar um formidável movimento cultural no Rio Grande, pois temos talentosos artistas em todos os setores. Basta que se organize a funcionalidade da Lei Sarney, que tem difícil operacionalidade. Basta que se obrigue que cada uma das estatais gaúchas, e empresas das quais o governo é parte forte, destinem de sua verba de propaganda, 5% para promoção cultural. Banco Meridional, Caixa Econômica Federal, Banco do Rio Grande do Sul, Secretarias e autarquias, seria um belo bolo a propiciar o crescimento cultural gaúcho.

 7. Aliando-se esse fundo ao apoio das empresas privadas, com manejo inteligente da Lei Sarney, teríamos fundos para fundamentar um verdadeiro renascimento cultural no Rio Grande do Sul.

 8. O Novo Governo precisa de uma Secretaria de Cultura para valer. Turismo, esporte e cultura valorizados e não mais subestimados. Chega de ver artistas, diretores, músicos, professores de dança, de pires na mão, à porta das agências solicitando apoio para cenários, impressão de ingressos, aluguel de iluminação, sonorização. Chega. Isso é triste. Desalentador. Isso não precisa mais. Chega.

 9. Elogio em boca própria é vitupério, diziam os gregos. Mas posso dizer que minha agência de propaganda tem um exemplar comportamento no que se refere a apoio cultural. Clientes como Zaffari, Olvebra, tem significativa presença no que se refere a apoio às iniciativas culturais. Se todas as agências tivessem o mesmo posicionamento, as artes estariam melhor aquinhoadas. Mas para as agências, na maior parte dos casos, destinar verbas a promoção cultural é perder ganhos de comissão em veiculação nos Jornais, rádio, TV, revistas. E assim, a arte dança.

10. Não acredito em visão ampla de desenvolvimento econômico que não envolva simultaneamente a valorização da vida cultural. Não existe um dilema, optar pelo bife ou optar pela melodia, são realidades, necessidades primordiais, tanto uma como a outra. Poderão dizer: ninguém morre por falta de arte, mas sim por falta de arroz, carne, mogango. Mas posso acrescentar, sem arte se vive, mas uma vida pobre, miseravelmente cotidiana. A arte é a alma de um povo, um povo é a sua arte. Ele revela sua fisionomia pela arte que faz.

11. É preciso elaborar com urgência um grande grave documento das pretensões dos artistas ao novo governo. O que querem, o que pretendem, o que farão. E estimular a arte não é só trazer a sinfônica de Berlim, é dar apoio ao menino que tira seu conjunto de Rock da garagem e quer subir pela primeira vez ao palco. Não é trazer o prêmio Nobel de literatura, mas estimular talentos verdadeiros, que querem editar suas primeiras obras. Quem é célebre não precisa impulso, já voa sozinho.

12. Conheço no Rio Grande obras prontas escondidas. Lembro o trabalho afro-gaúcho do Giba-Giba. Uma pesquisa profunda, uma criação rica sobre a presença do negro em nossa cultura. Onde está o apoio para gravar um disco? Estão esperando que chegue a parca?

13. O Rio Grande precisa fazer um pacto de modernidade, disse um dia. O gauchismo como narcisismo arcádico, está superado. Valorizar a arte espontânea do povo, do homem do campo. Voltar-se para as raízes, palavra que vejo com restrições, mas que tem adeptos, creio importante. Mas tudo isso para voar, criar, elaborar. Repetir o já feito. Dizer o já dito. A revolução modernista aconteceu em 1922, mas para certos gaúchos ainda não chegou. Eles criam o conflito entre tradição e modernidade. É preciso ser tradição nos motivos, conteúdos, mas ser moderno nas formas, caso contrário, não acontece arte. Acontece repetição. Aplaudida mas mesmo assim, repetição.

Fonte: Revista Tarca – Cultura Gaúcha – ANO III – nº 16 (AGO/SET/OUT/86) – p. 5

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