quarta-feira, 1 de abril de 2020

Romance das Invernadas (Aureliano de Figueiredo Pinto)




Nestas duas invernadas,
entre a em que estás e a em que estou
nosso Destino alinhou
os cernes das moironadas.
Os sete fios espichou
e um do outro nos separou
pelo vão do corredor
e as cercas emparelhadas.

Estar próximos e longe
é um dever que já é costume
pelos verões agüentados.
Vens no campeiro perfume!
E a minha voz vai no vento
por cima do impedimento
da faixa dos alambrados.

E relutamos cada um
em ir para o seu rodeio!
E se vamos, já volvemos,
mesmo sabendo que temos
estas divisas no meio.

Quando o sol nasce nos banha
aos dois de um mesmo fulgor.
E esta paixão se abre em flor
como a orvalhada campanha.

Quando o sol morre e se entranha
na lomba ao longe... e o arrebol
as sombras longas esmagam,
nossas pupilas se apagam
na sepultura do sol.

Se, na estrada, um andarengo,
por horas mortas cruzar,
verá aos lados, de relance,
dois vultos vivendo o transe
e o pastoreio-romance
das quentes noites de luar.

E mesmo assim apartados,
da mesma sanga bebemos!
Nos mesmos campos rondamos.
Varando os mesmos tapumes
os riscos dos vaga-lumes
são cartas que nos mandamos.

Sempre na mesma querência,
com a mesma emoção sentida,
livres da inveja e da injúria
vamos grameando a penúria
dos impossíveis da Vida.

Aureliano de Figueiredo Pinto. Romances de Estância e Querência – Marcas do Tempo. 3 ed. Porto Alegre: Movimento, 1997.

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