Um dia a rosa disse á brisa: « Brisa,
« Que fazes-tú, louquinha,
Por toda parte, a toda hora? A noite
« Não vês que se avisinha?
« Olha que a noite em seu escuro seio
« Occulta a mão traiçoeira,
« Com que bem pode, se a voar te apanha,
« Quebrar-te a aza ligeira.
« Ah! Não, não vôes, minha irmã, emquanto
« A falsa aqui andar;
« Colhe-te a um canto, até que venha a aurora,
« E o sol torne a brilhar.
« Bom agasalho te darei. Comigo
« Na minha verde casa
« Passarás mal, se mal é no meu seio
« Ter um leito a tua aza.
Porém a brisa disse a rosa: « Rosa,
« Não tenhas tanto medo,
« Deixa-me livre revoar e sempre
« No seio do arvoredo.
« Á noite, minha irmã, é como o dia
« Para quem não faz mal,
« Só entes máos devem temer as trevas,
« Aos bons toda a hora é igual.
« Deos quis que a sombra horrorisasse ao crime,
« E o remorso gerasse,
« E que á innocencia noite e dia um astro
« Na vida allumiasse.
« Quando a maldade se inquieta á noite
« Entre negras visões,
.. Por entre as trevas da innocencia guião
.. Mil dourados clarões.
Fonte: Cabrião: semanário humorístico editado por Ângelo Agostini, Américo de Campos e Antônio Manoel dos Reis: 1866-1867. Ed. fac-similar/introdução de Délio Freire dos Santos. São Paulo: Imprensa Oficial do Estado: Arquivo do Estado, 1982, p. 175.
Reprodução fac-similar do original de 51 fascículos, publicado em São Paulo no período de 30 de setembro de 1866 a 29 de setembro de 1867.
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