quarta-feira, 22 de dezembro de 2021

A rosa e a brisa (Cabrião)

 

Um dia a rosa disse á brisa: « Brisa,

« Que fazes-tú, louquinha,

Por toda parte, a toda hora? A noite

« Não vês que se avisinha?


« Olha que a noite em seu escuro seio

« Occulta a mão traiçoeira,

« Com que bem pode, se a voar te apanha,

« Quebrar-te a aza ligeira.


« Ah! Não, não vôes, minha irmã, emquanto

« A falsa aqui andar;

« Colhe-te a um canto, até que venha a aurora,

« E o sol torne a brilhar.


« Bom agasalho te darei. Comigo

« Na minha verde casa

« Passarás mal, se mal é no meu seio

« Ter um leito a tua aza.


Porém a brisa disse a rosa: « Rosa,

« Não tenhas tanto medo,

« Deixa-me livre revoar e sempre

« No seio do arvoredo.


« Á noite, minha irmã, é como o dia

« Para quem não faz mal,

« Só entes máos devem temer as trevas,

« Aos bons toda a hora é igual.


« Deos quis que a sombra horrorisasse ao crime,

« E o remorso gerasse,

« E que á innocencia noite e dia um astro

« Na vida allumiasse.


« Quando a maldade se inquieta á noite

« Entre negras visões,

.. Por entre as trevas da innocencia guião

.. Mil dourados clarões.


Fonte: Cabrião: semanário humorístico editado por Ângelo Agostini, Américo de Campos e Antônio Manoel dos Reis: 1866-1867. Ed. fac-similar/introdução de Délio Freire dos Santos. São Paulo: Imprensa Oficial do Estado: Arquivo do Estado, 1982, p. 175.


Reprodução fac-similar do original de 51 fascículos, publicado em São Paulo no período de 30 de setembro de 1866 a 29 de setembro de 1867.

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