terça-feira, 7 de junho de 2022

Paulo Sant’Ana

 

Eu fui um menino aqui do bairro Partenon, onde hoje é o Presídio Central. Eu era o vagabundo dos campos. Aquilo ali era uma fazenda, tinha mato, tinha pássaros das mais variadas espécies, tinha vacas, Eu andava no cipó, comia amora, pitanga, araçá, ameixa silvestre. Aquilo era um paraíso. Aqui dentro da cidade, eu morava no meio do mato. Eu morava numa casa boa, de alvenaria.


Tudo que eu sou na minha vida, de defeitos e virtudes, acontece porque eu não tive mãe. Minha mãe morreu quando eu tinha dois anos somente. Portanto, tudo o que sou de mau e de bom se deve ao fato de eu não ter minha mãe ao meu lado.


Depois eu vim aqui para a Azenha, isso quando eu já tinha uns 15 anos de idade, mais precisamente na rua 20 de Setembro esquina com Barão do Triunfo. Aquilo ali era a Esquina do Pecado. Ali se juntava 30, 40 rapazes e jogávamos pif-paf, dadinho e brincávamos. E foi ali que eu aprendi a discutir futebol. Frequentavam a esquina o Dilamar Machado, o Marco Aurélio Garcia.


Nesse tempo, eu fui baleiro no Cinema Castelo e depois Cinema Avenida. Também vendi pastéis nos quartéis da Brigada Militar e, depois, eu fui feirante por cinco anos. Eu armava a barraca perto das cinco horas da manhã e vendia balas, bolachas, bombons, tudo isso numa tenda do quarto grupo de feira livre.


Trabalhei como auxiliar de caminhoneiro, indo a São Paulo buscar doces e balas para vender em todo o interior do estado.


Fiz concurso para inspetor de polícia; aprovado, trabalhei em Tapes, Arroio dos Ratos, Triunfo e São Jerônimo. Em Porto Alegre, trabalhei com o fiscal Elpídio, fazendo a ronda noturna pelos botecos da Voluntários da Pátria.


Mais tarde, me elegi vereador, fiz o curso de Direito e, através de concurso, fui ser delegado de polícia.


Falando em concurso, aconteceu um fato muito interessante. Eu fui reprovado num concurso interno, como inspetor, e no concurso externo, para delegado, em que existiam 324 candidatos, eu tirei primeiro lugar. Dá para entender isso?


E foi essa a minha vida, de feirante, de baleiro, de pasteleiro, de policial e de jornalista.


E o que é o jornalista senão um vendedor de balas, pastéis e guloseimas para seus leitores e ouvintes?


Fonte: Coiro, José/Grabauska, Cléber. Sala de redação: a divina comédia do futebol. Porto Alegre: L&PM, 1998, p. 123/127/128.




Capa: Ivan Pinheiro Machado sobre ilustração de Edgar Vasques

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