segunda-feira, 10 de julho de 2023

Zeferino Brasil por Carlos Reverbel

 

A obra de Zeferino Brasil, formada por treze livros, foi iniciada em 1891, com Alegros e Surdinas, e concluída em 1935, com alma Gaúcha, poema épico em celebração do centenário da Revolução Farroupilha. Segundo o prof. Dionísio Fuertes Alvarez, que prefaciou a obra, “Alma Gaúcha é um dos poucos poemas épicos, dignos desse nome, que produziu a literatura do Rio Grande do Sul”. Dos treze livros de Zeferino Brasil quatro já foram reeditados pelo Internacional, inclusive Vovó Musa, que tivera duas edições anteriores, em 1903 e em 1917, proporcionando ao autor o título de “príncipe dos poetas gaúchos”.

Creio ter sido o repórter que entrevistou Zeferino Soares pela última vez. Sabendo de seu precário estado de saúde, na avançada idade a que chegara (71 anos), resolvi captar-lhe uma espécie de entrevista testamento. Ele publicara, pouco antes, na Revista do Globo, uma espécie de testamento sentimental, através de um soneto de muita ternura, dedicado a D. Celina, sua mulher, no dia das bodas de ouro do casal. Ainda sou capaz de reproduzir, de memória, os tercetos desse derradeiro soneto:

Velhinhos sempre unidos e abraçados

entre risos e flores caminhando,

como dois venturosos namorados,

nós vamos nossas vidas continuando,

meus olhos nos teus olhos extasiados,

teu coração dentro do meu pulsando”.

Numa tarde de domingo, fui procurá-lo em sua modesta casa, situada na Rua Pantaleão Teles nº 728. A fuligem do velho Gasômetro, que ficava na vizinhança, estava funcionando a todo vapor. Recebido que fui por D. Celina, o poeta não tardou a aparecer na humilde sala de visitas, com a vasta cabeleira revolta, a gravata ainda à Lavallière e claudicando, apesar da bengala que o ajudava a locomover-se, desde moço.

Disse-lhe do objetivo de minha visita, passando-lhe às mãos, a seguir, o questionário que trouxera redigido, com doze perguntas, cujas respostas recolheria no dia que ele determinasse. E assim as coisas se passaram, assegurando-me o privilégio de poder conservar, até hoje, precioso autógrafo, na bela caligrafia de Zeferino Brasil.

A entrevista saiu na edição da Folha da Tarde de 27 de janeiro de 1942 e o poeta veio a falecer no dia 3 de outubro do mesmo ano. Durante a entrevista, Zeferino Brasil confidenciou-me que estava escrevendo suas memórias, mas que deixaria recomendação para somente serem publicadas dez anos após a sua morte. Fui advertido, na ocasião, para não cometer nenhuma indiscrição, deixando de divulgar os episódios de suas memórias que ele me revelara, em confiança. Eu deveria publicar, apenas, as respostas ao questionário que eu lhe entregara no domingo anterior, e que ele me devolvia, completamente preenchido, de próprio punho. E tudo se fez, conforme sua vontade.



Capa: Tânia Porcher

Foto: Jorge Rolla

Fonte: Reverbel, Carlos. Barco de papel. Porto Alegre: Editora Globo S.A., 1978, p 73/74.

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